Vinha eu a levantar algumas questões sobre o processo económico para que a sociedade ocidental parecia arrastada, quando decidi parar: ou eu tinha razão e iria estrondear uma crise aguda, ou não, e seria irrelevante continuar.
A crise veio mesmo, reforçando a sensação de inevitabilidade que me parecia evidente.
Está o mundo em alvoroço, percebe-se que a sociedade da facilidade e irresponsabilidade chegou ao fim, mas ninguém conseguiu ainda antever o que se lhe seguirá. Tenta-se encontrar o caminho com menos escolhos e sacrifícios, mas ninguém sabe muito bem para onde, acolhendo-se toda a gente ao conforto da esperança de que “isto” não tenha passado de mais um sobressalto, maior que o costume, mas natural numa economia que se sonha fadada a conduzir-nos a todos para melhor.
Importa reconhecer que, até agora, a economia ocidental se limitou a receber soro e balões de oxigénio. A verdadeira terapia não foi sequer definida.
Fala-se na protecção do emprego (claro!) mas as medidas anunciadas são apenas paliativas, geradoras de pequenos incrementos num processo estabilizado, mas insuficientes num processo em degradação.
Malha-se no cravo e na ferradura, quando se anuncia que é preciso facilitar o crédito para dinamizar a economia, e restringi-lo para prevenir a repetição dos desequilíbrios que se verificaram.
Há a esperança Obama, para já apenas uma esperança.
No meu texto “As árvores que tapam a floresta” prometia sugerir pistas de intervenção, com a consciência de não haver milagres, e de haver, seguramente, gente muito mais competente e informada do que eu para apontar o caminho. Mas o caminho faz-se caminhando, e cada um pode e deve dar o seu contributo, por menos relevante que seja. É isso que me proponho fazer.
Parece-me claro que a deslocalização de negócios é o trunfo usado pela economia para neutralizar o efeito regulador dos sindicatos, neutralização essa que está a esmagar as classes médias e os equilíbrios económicos nos países mais ricos. É aí que urge agir.
Para fixar territorialmente um maior número de negócios, para efectivamente proteger o emprego, é preciso reformular muito profundamente, toda a economia, direito laboral e mesmo fiscalidade.
A título de exemplo, e como instrumento de reflexão, atrevo-me a sugerir uma bateria de 10 medidas “loucas”… mas talvez não!
1 – Aumento do IVA, na União Europeia, em, pelo menos, 5% (calma! Esperem pelo resto);
2 – Aumento simultâneo, na mesma percentagem, de salários, pensões e rendas habitacionais;
3 – Contabilização desse aumento de IVA como receita da Segurança Social (com mais uma tranche variável, a definir por cada país);
4 - Redução das contribuições das empresas para a Segurança Social para um valor entre 0 e 10%, a definir abatendo aos 10% o resultado do quociente entre o peso salarial no volume de negócios da empresa e o respectivo leque salarial;
5 – Liberalização dos despedimentos, mantendo-se apenas a penalização das empresas no despedimento de representantes dos trabalhadores, que passará a ser paga à Segurança Social e não ao despedido;
6 – Extinção das indemnizações por despedimento;
7 – Obrigação para as empresas de contabilizarem, mensalmente, um aumento de capital no montante de 8% dos salários pagos, que passará a ser propriedade dos trabalhadores na proporção dos respectivos salários;
8 – Controlo rigoroso do crédito ao consumo;
9 – Taxação progressiva de todas as operações com off-shores, até à sua inviabilização total.
10 – Reforço da punição da publicidade enganosa, e proibição de publicidade condicionadora.
Uma revolução? Claro!
Mas alguém pensa que isto lá vai com “incentivos”?
Talvez volte, mais logo, a clarificar os porquês das medidas elencadas. Deixo, no entanto, algumas pequenas questões que ajudam a perceber a maioria delas:
“Protecção do emprego” – Uma empresa não pode despedir UM trabalhador; a solução actual, para se ver livre de uma “ovelha ronhosa” é… despedir muitos!
“Tenho 50 empregados, a quem pago um total de 50.000 €, contribuindo para a Segurança Social (SS) com cerca de 12.000 €. Vou comprar máquinas para expandir o negócio (ou transferi-lo para Marrocos), escolhendo 5 dos trabalhadores e despedindo os outros 45. O que me faz o Estado? Premeia-me: deixo de pagar 12000€ para a SS e passo a pagar 1.200 €. Obrigado!”
“Motivação” – Se as “stock options” funcionam com os quadros, porque não com a generalidade dos trabalhadores’?
“Deslocalização” – haverá melhor forma de a combater do que a ligação do pessoal à gestão, e a penalização dos negócios vindos de fora?
“Indemnizações” – Direito “teórico” de que a generalidade dos trabalhadores não beneficia, porque quando chega a hora não há recursos.
“Off-shores” – Os “pequenos” dinheiros cumprem obrigações sociais (fiscais). Porquê proteger os “grandes”?
“Gastar até o que se não tem, para comprar o que não se precisa” – Será legítimo a liberdade condicionadora da actual publicidade?
E mais não digo. Para já!
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