terça-feira, outubro 26, 2010

    Vamos ao HIPER


Até este fim-de-semana estava tramado:


Se precisava de legumes tinha que comprar os produtos do Valado de Frades.

O peixe era um drama – tinha que comer o que vinha da Nazaré ou Peniche.

Carne? Uma séria limitação, só tinha os animais abatidos pelo sr Armando do talho, ou as galinhas e coelhos das vizinhas que vendiam.

Fruta era um dó – peras do Oeste, laranjas do Algarve, uvas do Ribatejo, morangos, maçãs, ameixas ou pêssegos cá da terra, uma lástima.

Da roupa já tinha desistido – as lojas da terra só tinham lanifícios da Covilhã, têxteis de Vizela, enfim… essas “portuguesissses”. O mesmo aliás se passava com o calçado, onde as opções não iam além da Benedita ou S. João da Madeira.

Nem vale a pena continuar – era uma tristeza!

Mas agora abriram os hipers ao domingo. Hurrah!

Já posso comprar legumes do Chile, fruta da África do Sul, carne da Argentina, peixe russo, roupa da China, calçado da Indonésia, enfim, tudo aquilo de que precisamos para salvar a economia nacional.

Por isso não entendo as lágrimas da ti Ernestina, uma queijeira lá da terra que diz que tem de parar, porque três da oito lojas que lhe compram o queijo vão fechar. Caramba, a ti Ernestina só tem 53 anos, vai com certeza ter um dos milhares de novos empregos nas caixas do Continente.

Só queria pedir mais uma coisa:

Quando vou fazer as compras ao domingo, a confusão é muita. Queria pedir ao Governo que pusesse os ministérios, as repartições, os bancos, os correios e outros a trabalhar ao domingo – sempre era menos gente a estorvar, e, se perguntarem a todos aqueles que se congratularam com a abertura dos hipers ao domingo, a esmagadora maioria vai aprovar a ideia, porque dá mesmo muito jeito a todos os não atingidos.

É provável que a abertura dos ministérios e repartições tenha a oposição dos funcionários públicos, a dos bancos a dos bancários, dos correios a dos respectivos empregados, mas cada uma dessas classes não passa de uma minoria idêntica à dos pequenos comerciantes, dos pequenos agricultores, dos pequenos industriais que não conseguem entender que o futuro de Portugal passa pelo estender da passadeira às multinacionais e seus agentes distribuidores, e ainda vivem na ilusão de que o futuro do País se possa construir com recurso aos produtores e distribuidores portugueses.

Ah! E se for preciso também explico ao Governo qual é o ÚNICO sector da actividade portuguesa onde é preciso reduzir o tempo de trabalho, aumentar ordenados e regalias sociais, reforçar os direitos dos trabalhadores, manter a folga ao sábado e domingo, com um dia de despensa por semana para poder tratar de assuntos sem comprometer o descanso, e baixar a reforma (por inteiro) para os 35 anos.

Sem egoísmos, nem egocentrismos, evidentemente!

PS - Consta que algumas grandes superfícies se preparam para fornecer também missas, tendo já sido aberto concurso para as importar do Brasil ou da Etiópia, onde estão a um preço imbatível

quinta-feira, outubro 14, 2010

A Greve Geral

Aí vem a esperada greve geral. Depois de anos a definhar, o sindicalismo português recebeu de bandeja esta oportunidade única para fazer de conta que ainda existe.


Ninguém tem dúvida que a greve se anuncia um sucesso – o nível de insatisfação e irresponsabilidade que se instalou entre nós não pode levar a outro resultado que não seja a paralisação quase total do País. Com sucesso?

Bem…

Há esse risco – é do domínio público que bastou a ameaça de paralisação para as polícias conseguirem um estatuto de privilégio relativamente ao restante funcionalismo público. Há, de facto, a possibilidade de um governo desorientado ceder às pressões, e embarcar numa política de nuances e excepções como as previstas para as SCUT, sacrificando a equidade e a justiça social à menor ou maior capacidade em agitar os media dos diferentes grupos profissionais, regionais ou outros. Uma política casuística por encomenda ou pressão, é o que falta para desacreditar em absoluto um regime que há muito perdeu a confiança e o respeito dos Portugueses.

Mas há a esperança de que, dada a tremenda gravidade da situação do País, a greve seja inconsequente, nada mais representando que uma maciça demonstração do óbvio – “Os Portugueses estão fartos desta situação”. Se assim for, então a greve, nada resolvendo como seria de esperar, terá o mérito de ser mais uma, de ser mais um povo europeu a dizer na rua aos seus governantes que isto não vai lá só com medidas técnicas de rapinanço de salários, e que urge procurar alterações de fundo na regulamentação da economia que salvem o que de melhor a Europa soube construir no século passado – a Economia Social.